A pouco tempo eu estava olhando o blog Chiclete Violeta quando me deparei com esse texto escrito pela autora do blog, Victoria ou Vickie O texto foi inspirado no livro Morte Súbita. Gostei muito dele então resolvi traze-lo para vocês. Espero que gostem...
Ela acordou. Que dia difícil. O jeito foi dormir a tarde
inteira. Olhou no espelho. Cabelo liso. Por que isso? Todas as amigas dela
tinham cabelos volumosos e coloridos, e ela tinha um cabelo sem graça. Ele
estava certo. Ela era feia. Olha esse rosto. Olha esse corpo. Que gorda.
Precisa fazer imediatamente uma dieta. Mas ela está olhando pra um pacote de
Doritos. Senta-se na cama, abrindo o pacote. É bom. Ela aposta que as amigas
comem toda hora. Afinal, todas são magras. Terminou. Já? Levanta de novo. Meu Deus,
ela deve ter engordado 500 quilos! Mas isso não é possível.... olha essas
pernas grossas! Que horror, nenhuma calça deve caber nela. A mãe chamando. Que
raiva, será que ela não podia ficar em paz? Mas paz era a última coisa que ela
tinha. A calça do uniforme estava apertada. A blusa também. Os pés gordos
pisavam o chão frio. Ela abriu a porta de madeira. Devia ser umas oite, nove
horas da noite. Pensou. O menino que ela gostava. A chamou de gorda na frente
de todos! Lembrou-se das risadas, das pessoas apontando. Lembrou-se da mãe
ligando para o nutricionista. Ela devia estar com obesidade mórbida. O banheiro
estava fechado. Ela empurrou a porta. Subiu em cima da balança. Não. Não tinha
coragem de olhar o número. Deveria? Não. Desceu. Olhou para o vaso sanitário. A
tampa estava levantada. Olhou no pequeno espelho. Olha essas espinhas. E essas
manchas terríveis debaixo dos olhos. Olheiras? Deveria ser. Não dormia direito
há séculos. Sentiu o estômago embrulhando e aquele gosto picante na boca.
Ajoelhou-se. Colocou o dedo gordo na garganta. Pronto. Tudo pra fora. Que nojo.
Nojento, como ela. Se sentia mais magra. Deu a descarga e voltou para o quarto.
Trancou a porta.
Por que ela tinha que ser tão feia? Tão chata, tímida. Não
tinha amigos. A única amiga a trocou. Era filha única, nada de experiência
social. O pai trabalhava o dia inteiro e tinha certeza que a mãe tinha vergonha
da filha. Lágrimas brotaram nos olhos amendoados. Ela tinha que ser bonita. Só
assim ele ia gostar dela. Tinha que ser magra. Afinal, todas as mulheres
bonitas são magras, não é? Nenhuma modelo usava óculos, nem aparelho. A
Angelina Jolie? Nasceu perfeita. Não nasceu prematura e doente que nem ela. Não
nasceu com diabetes. Não tinha que esconder barras de chocolate debaixo do
travesseiro. Não tinha que injetar uma substância todos os dias na barriga.
Lembrou-se do Halloween, quando a garota popular, aquela ruiva, metida... disse
que não precisava de fantasia. Óbvio que não, já era um monstro. Lembrou-se do
banheiro trancado. Da dor no coração. Do apontador no bolso direito. Daquela
lâmina afiada e da sensação de cortar a própria pele. Ver o sangue jorrando.
Queria morrer. Queria sumir, desaparecer. Lembrou-se também do aniversário da
amiga. Teve que injetar a insulina na frente de todos. Lembrou-se dos barulhos
de vômito, das zoações e brincadeiras. Lembrou-se dela pegando o celular
tremendo. Da voz da mãe. Do apelo. Lembrou-se da coordenadora. Que disse que
ela não precisava se preocupar. Que tudo iria ficar bem. Mas logo saiu, para o
refeitório. Sentiu o cabelo molhado. Será possível que jogaram refrigerante
nela? Era. E aqueles mugidos. O apelido de vaca. A chamavam de vaca. Por que? O
que ela fez? Sabia. Ela não era perfeita. Era burra, gorda, feia e antissocial Não lembra da última nota acima de seis que
tirou. Não lembra de uma conversa com o pai sem ser chamada de irresponsável.
Mas como poderia estudar se as pessoas a chamavam de hermafrodita, de nojenta,
de ridícula? Toda vez que levantava a mão para perguntar algo, ficavam mugindo.
Como iria estudar olhando a ex-melhor amiga se divertindo com a ruiva? Como
poderia sequer pensar em se esforçar quando o menino que era apaixonada ficava
fazendo barulhos de vômito quando a via? Não tinha amigos. Era sozinha.
Pegou a lâmina. Pequena. Ela estava cansada disso. Estava
doendo. Sua última sessão deixou marcas. Estavam em pleno verão e tinha que
usar mangas compridas. Lembra-se da última aula de matemática quando um dos
cortes recomeçou a sangrar e encharcou a prova da menina. Lembra-se da enfermeira.
A enfermeira viu. Teve que implorar para não contar para seus pais. Disse que
era seu gato. Isso não funcionava. Então levantou-se e escreveu com a lâmina na
própria barriga: feia. Estava doendo. Talvez a gordura saísse. Mas só saia
sangue. Pegou o lençol e amarrou. Deitou na cama e recomeçou a chorar. Que
menino iria querer sair com uma garota cortada? Toda machucada, sangrando
e...feia? Vaca. Nojenta. Burra. Hermafrodita. Não podia conter o choro. Não
sorria mais. Não se lembrava da última vez que riu. Abriu a gaveta. Cheia de
comprimidos. Abriu vários. Quantos? 10. Olhou para o copo d'água. Estava quase
vazio. Tinha que ser rápida. Escolheu só cinco. 10 era muito. Os maiores. Como
ela. Ingeriu tudo rapidamente. Sentiu enjoo. Tontura. Nojo de si mesma. Ah,
como se odiava. Antes dos remédios fazerem efeito, voltou a banheiro. Se pesou.
Olhou o número com olhos arregalados. Imensa. Gorda. Era mais do que imaginava.
Voltou para o quarto e fechou os olhos. O número flutuando na sua mente. Sentiu
um baque no coração. Morreu com aquele número nos olhos. 27 quilos. Com certeza
suas amigas eram muito mais magras. Muito mais...perfeitas.


Espero que vocês tenham gostado, não se esqueçam de passar no blog e no canal do Youtube do Chiclete Violeta, e até a próxima garotas desligadas!
Amei! Adorei! Chorei!
ResponderExcluirEu também! Que bom que gostou.
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